sábado, 30 de novembro de 2013

Vou fugir para o Uruguai

Faz exatamente um ano que parti para o Uruguai. De Montevidéu, eu e mais duas amigas alugamos um carro e pegamos estrada, ou melhor, a Interbalneária, em direção à costa. Embora o país mantenha seus atrativos para quem gosta de opulências e outras orgias capitalistas, parece que o comunista Mujica não é o atual presidente da República Oriental por engano. O povo uruguaio parece o mais culto da América Latina, as desigualdades parecem insignificantes e a paz certamente é o aspecto mais marcante do país, que tem por slogan "natural". Encontrar colônias de argentinos instalados em comunidades sustentáveis perto de praias não é incomum. Não só argentinos, mas pessoas de várias partes do mundo (até um vietnamita encontrei) entenderam logo que um dos lugares mais tranquilos que existem é o Uruguai. Coitados dos que têm que fugir para o México. Eu posso e quero é fugir para a terra de Vilaró e Galeano um dia. Esse é o plano. Para se ter uma ideia dessa "atmosfera" bem própria do Uruguai, o filme "Além da estrada" é um belo retrato. E, para finalizar a sessão nostalgia, embora a trilha sonora da minha viagem tenha sido Jorge Drexler, o som do vídeo a seguir tem a exata pegada da noite em uma casinha de La Barra ou em Cabo Polonio . 


Judith Butler

Eu não seria eu sem Judith Butler. Formadora de subjetividades, a admirada filósofa que rejeita classificações concedeu entrevista à revista Cult (último número), de onde  se extrai o seguinte trecho (aprecie sem moderação):

"Precisamos, inicialmente, estabelecer a  distinção entre uma crítica da identidade e uma crítica do humanismo. Por exemplo, podemos imaginar certos humanistas criticando a identidade precisamente porque algumas delas atrapalham nossa compreensão da humanidade comum. Então os dois projetos são diferentes. Quando falamos numa crítica da identidade, não significa que desejamos nos livrar de toda e qualquer identidade. Pelo contrário, uma crítica da identidade interroga as condições sob as quais elas se formam, as situações nas quais são afirmadas, e avaliamos a promessa política e os limites que tais asserções implicam. Crítica não é abolição. Por fim, faz grande diferença se alguém toma “ser uma lésbica” ou “ser um judeu” como fundamento ou base de todas as suas outras visões políticas, ou se, ativamente, compreende que as categorias são historicamente formadas e ainda estão em processo. Então, minha perspectiva é a de que não é útil basear todas as demandas políticas de alguém em uma posição de identidade, mas faz sentido levantar, como uma questão política explícita, como as identidades foram formadas, e ainda são construídas, e que lugar elas devem ter num espectro político mais amplo. Por exemplo, as alianças tendem a ser descritas como a união de várias identidades, mas uma razão pela qual elas são dinâmicas, mesmo democráticas, é que as identidades são transformadas à luz dessa união e, muitas vezes, tornam-se menos importantes quando são constituídas com certos objetivos em mente, como a privatização, a homofobia ou o estado de violência."

Por que Marx ainda assusta os conservadores?


Mais de duas décadas após o fim da União Soviética e do comunismo no Leste Europeu e mais de três décadas após a constatação, por diversos intelectuais, da crise de narrativas de pretensões universalistas como o marxismo, os conservadores ainda tremem quando ouvem falar o nome do filósofo de Treves. Mas isso é compreensível: mesmo que o marxismo, enquanto projeto revolucionário herdeiro do iluminismo tenha arrefecido, o marxismo como crítica social permanece um importante instrumento de luta contra a desigualdade e a concentração de renda, especialmente nos países do capitalismo periférico. Os conservadores temem a crítica social porque temem a mudança, e não querem mudanças porque também não desejam perder privilégios.
Hoje não falamos mais em revolução proletária, classe operária, burguesia, ditadura do proletariado. Mesmo o conceito de ideologia, que Marx e Engels tomavam como uma forma de consciência invertida do mundo,  não é mais tomado nesta acepção há décadas. O marxismo do século XX não se reduziu apenas à esfera econômica, mas também teve representantes em áreas bastante distintas como a psicanálise e a linguística.
Se durante o século passado era impossível ficar indiferente ao pensamento de Marx, hoje podemos estudá-lo sem a necessária tomada de partido de uma visão dicotômica marcada pela adesão ou a ojeriza. Contudo, nem todos ainda pensam assim. Um fascista como Olavo de Carvalho dedicou mais de duas décadas tentando desmontar inutilmente o pensamento marxista com base apenas em teorias conspiratórias, denuncismos rasteiros de jornalista de extrema direita mesclados com boa dose de fanatismo religioso, que abocanha apenas uma parcela da juventude mimada de classe média e outros fanáticos tão raivosos quanto o próprio Olavo.
Recentemente, outro jornalista de direita, Rodrigo Constantino, publicou em sua coluna na revista Veja uma carta de um universitário de Santa Catarina que recusou-se a fazer um trabalho sobre Marx porque se considera de “direita até a medula”, acha que “a epidemia de drogas, a criminalidade e o desrespeito aos mais velhos são sintomas de uma revolução de inspiração marxista em curso” é monarquista e um budista armamentista, apaixonado por esportes medievais. Veja o leitor como a mente do rapaz é confusa. Sua postura reflete um sintoma de intolerância que a extrema direita tem difundido através das redes sociais (único lugar onde conseguem proliferação, uma vez que não possuem força política).
Isso também evidencia o descontentamento de grupos privilegiados com as políticas sociais dos governos Lula e Dilma, a expansão das universidades, a ampliação do acesso de pessoas de baixa renda a cursos de nível superior em instituições públicas e privadas e a ascensão social promovida pelas políticas de transferência direta de renda. Embora o PT não seja um partido socialista, a direita o odeia por uma causa em especial: promoveu ascensão social, colocando em convivência classes outrora separadas pelo imenso abismo social segregacionista que herdamos da ditadura e de governos populistas antes e depois dela.
O que restou a essa direita foi o denuncismo conspiratório, a associação dos governos de esquerda da América Latina ao “terrorismo”, tráfico de drogas, criminalidade e quaisquer outras mazelas que possam colocar na conta. Gramsci lhes desperta pavor como se fosse o próprio Diabo. Aterrorizados, refugiam-se na mesma mentalidade extremista que engendrou o fascismo há quase um século. O rapaz catarinense comete um erro grosseiro ao rejeitar ler Marx. Talvez pense que possa tornar-se marxista lendo Marx, ou talvez pense que está fazendo uma concessão à esquerda. De todo modo, ele acha que não precisa ler sua obra numa cadeira de Ciência Política. Então ele não lerá toda a Escola de Frankfurt, nem os marxistas culturalistas do século XX, nem mesmo compreenderá adequadamente os críticos do marxismo. Ele pensa que está na universidade para enfrentar professor e ler apenas o que lhe agrada. Ao invés de ler o filósofo alemão para entender a formação do mundo contemporâneo e até cotejar sua obra com a de outros autores, o playboy escreveu uma carta ao professor e ainda publicou na internet, em um gesto risível de orgulho de própria estupidez.
O mesmo erro poderia ser cometido por um marxista que recusasse a ler Adam Smith ou Hayek, ou um evangélico (e esse exemplo também já aconteceu) sobre religiões umbandistas. Em todos os casos o que está em evidência é a ignorância. O rapaz não sabe que Marx é importante por sua análise da mercadoria. Não, a única coisa que ele aprendeu sobre Marx foi a repudiá-lo, a odiá-lo e culpá-lo por tudo de ruim que aconteceu na história recente da humanidade. Esse é o mesmo tipo que sai por aí dizendo que nazismo e fascismo eram ideologias de esquerda e, como ele próprio diz, que o Brasil era melhor durante a monarquia. Um rapaz branco, filho de empresário bem-sucedido prefere a monarquia. Mas por quê? Talvez porque os ricos da corte ficavam confortavelmente isolados em seus palácios, possuíam escravos e mantinham a imensa maioria da população pobre, para quem eles jamais prestavam contas, massacrada na indigência. Ou porque no Brasil Império revoltas sociais eram reprimidas com banhos de sangue.
O problema dos conservadores brasileiros não é que eles não aprendem com os próprios erros, mas que eles querem continuar cometendo esses erros, alegando agir em nome da moral, da família, dos bons costumes, da religião. Não importa que o latifúndio seja um roubo, eles querem milhões de sem terra para manter sua escravidão moderna, como ainda infelizmente acontece com certa frequência em fazendas no Pará, Tocantins e outros Estados do Norte e Nordeste.  Querem a manutenção do patriarcalismo, o silenciamento das mulheres, a volta do Padroado – o passado onde os segmentos sociais privilegiados podiam levar suas vidas idílicas longe de governos populares e populistas. Eles não querem jovens libertários protestando nas ruas, pois estão acostumados a ver a polícia espancar os “arruaceiros”. Eles querem o poder apenas para Bolsonaros e Felicianos desancarem, sob a proteção da legalidade, todo tipo de preconceitos e racismo.
Este ano de 2013 a publicação do Manifesto Comunista completa 165 anos e o fantasma de seus autores ainda aterroriza muita gente. Alguns até pedem por outro golpe militar. A inclusão social promovida pelos últimos três mandatos presidenciais tem incomodado a muitos. Na falta de projetos políticos, ou de propostas concretas para melhoria da nação, a culpa é de Marx, Gramsci e toda a história brasileira é reduzida a apenas dez anos, como se todos os nossos problemas sociais e políticos não existissem antes disso, não possuíssem historicidade nem estivessem imbricados em nossa formação cultural antes mesmo de existir Marx e partidos de esquerda. Mas é nisso o que dá não querer fazer trabalhos pra discutir história e ainda se orgulhar de ser o menininho mimado do papai, adulado por uma revista de extrema direita.
Fonte: http://bertonesousa.wordpress.com/2013/10/07/por-que-marx-ainda-assusta-os-conservadores/

0,5

Não importa que aniversários sejam anuais: escrevo e manifesto o que eu quiser aqui – o blog foi feito exatamente para isso – e hoje inventei de comemorar o meio primeiro aniversário do EmMissão.  Quando o blog nasceu, até pelo nome, eu já sabia que ele seria uma trincheirinha comunicativa.  Era para ser anônimo, nenhum conhecido saberia de sua existência (parece sedutora a magia da descoberta aleatória de buscas no google, os visitantes chegando sem maiores vieses...). Mas irromperam as "jornadas de junho" e o compartilhamento de registros e impressões foi inevitável. Até porque, percebendo que nenhum discurso é neutro e que não adianta insistir em busca de consensos, toda comunicação envolve uma luta e a missão deste blog é de resistência face às podres visões hegemônicas de mundo.

Pois é, discurso é jogo de luta. O sujeito se constitui no interior mesmo da história e é a cada instante fundado e refundado pela história. Ou seja, a constituição histórica de um sujeito de conhecimento se dá através de um discurso tomado como um conjunto de estratégias que fazem parte das práticas sociais.  Foucault (A Verdade e as Formas Jurídicas) diz que há dois tipos de verdade. O primeiro, a verdade interna, sendo aquela produzida pela ciência. O segundo, a verdade externa, tratando-se justamente das regras de jogo a partir das quais se moldam formas de subjetividade, domínios de objeto e certos tipos de saber. E, com base no pensamento de Nietzsche, o conhecimento não é delineado de antemão pela natureza humana, mas é resultado de uma luta; o risco e o acaso é que lhe dão lugar.

Em outras palavras, a crença na existência de uma natureza ou de condições universais do conhecimento é uma falácia. O conhecimento é o resultado histórico e pontual de condições, possuindo um caráter perspectivo. As condições políticas e econômicas de existência não são obstáculo para o sujeito de conhecimento, mas aquilo através do que ele se forma e, por conseguinte, se formam as relações de verdade.

E como as pessoas obtêm conhecimento e formam opinião? Através da comunicação. Nas sociedades contemporâneas, a mídia transmite valores como se fossem universais, sob uma suposta presunção de imparcialidade. Cabe a quem identificá-lo desconstruir esse discurso, de modo a representar a verdade de forma ativa, e não passiva-hipnotizada-que segue o fluxo da corrente ideológica hegemônica (da hegemonia à totalidade, isto é, ao totalitarismo, é um piscar de olhos). 

Assim, apesar dos propósitos bem intencionados do EmMissão, da missão de emitir contrapontos, a cabeça desta blogueira Elle (trocadilho com a inicial de meu verdadeiro nome, a letra "L") vive povoada por fantasmas – obsessores, por vezes – na montanha russa emocional da vida. Então celebro que o blog é também um ombro amigo e companheiro de madrugadas, ou uma espécie de mar sempre disposto a receber meus sentimentos transbordados em palavras. Nunca vou me esquecer da frase de Wright Mills: "escrever é, entre outras coisas, sempre uma maneira de compreender a nós mesmos".

Também comemoro o aniversário 0,5 porque volta e meia encontro pessoas insuspeitas, que jamais imaginei que me lessem, inusitadamente elogiando o blog e querendo discutir sobre postagens. Aí vejo que, com toda a sua simplicidade e humildade, o blog realmente consegue tocar corações e mentes de vez em quando, confirmando sua pretensa vocação político-informativa  de incomodar acompanhada de alguma sensibilidade peculiar. Tem, também, os comentários empolgantes e as críticas das pessoas mais chegadas, o que leva a crer que valeu a pena sair do total anonimato inicialmente pretendido.

Enfim, pela experiência, pela necessidade, por mim, por quem quiser, pela alegria de encontros e argumentos, pela interação, com afeto e com açúcar, parabéns e um abraço a quem tem feito parte deste terreninho cibernético de livre pensar e sentir.

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Inteligência pra quê?

Matéria sobre estudo que aponta que pessoas de esquerda são mais inteligentes do que pessoas de direita, publicada ano passado, voltou a circular nas redes sociais esta semana. Por mais sentido que a conclusão da pesquisa faça, não parece estranho ainda não termos dominado o mundo e realizado a revolução?

 
Do blog Viomundo:
 

Sorria, você é mais inteligente

publicado no em 15 de fevereiro de 2012 às 2:35
 
Quanto mais inteligente, mais à esquerda (gráfico do Psychology Today, via Aldeia Gaulesa)
 
 
Um polêmico estudo canadense que inclui dados coletados por mais de 50 anos, diz que as pessoas com opiniões políticas de direita tendem a ser menos inteligentes do que as de esquerda. Ao mesmo tempo, adverte que as crianças de menor inteligência tendem a desenvolver pensamentos racistas e homofóbicas na idade adulta.
A pesquisa foi realizada por acadêmicos da Universidade Brock, em Ontário, e coletou a informação em mais de 15 mil pessoas, comparando o seu nível de inteligência encontrado na infância com os seus pensamentos políticos como adultos.
Os dados analisados ​​são dois estudos no Reino Unido em 1958 e 1970. Eles mediram a inteligência das crianças com idade entre 10 e 11 anos. Em seguida, são monitorados para descobrir suas posições políticas após 33 anos de idade.
“As habilidades cognitivas são fundamentais na formação de impressões de outras pessoas e ter a mente aberta. Indivíduos com menores capacidades cognitivas gravitar em torno de ideologias conservadoras que mantêm as coisas como elas são, porque isso as fornece um senso de ordem”, dizem no estudo publicado no Journal of Psychological Science.
Segundo as conclusões da equipe, as pessoas com menor nível de inteligência gravitam em torno de pensamentos de direita, porque esse os faz sentir mais seguros no poder, o que pode se relacionar com o seu nível educacional, inclui o jornal britânico.
Mas esta não é a única conclusão a que chegou o estudo. Analisados dados de um estudo de 1986 nos Estados Unidos sobre o preconceito contra os homossexuais, descobriu-se que pessoas com baixa inteligência detectado na infância tendem a desenvolver pensamentos ligados ao racismo e homofobia.
“As ideologias conservadoras representam um elo crítico através do qual a inteligência na infância pode prever o racismo na fase adulta. Em termos psicológicos, a relação entre inteligência e preconceitos podem ser derivadas de qual a probabilidade de indivíduos com baixas habilidades cognitivas apoiarem com ideologias de direita, conservadoras, porque eles oferecem uma sensação de estabilidade e ordem “, acrescentou.
“No entanto, é claro que nem todas as pessoas pessoas prejudicadas são conservadoras”, disse a equipe de pesquisa.

Mulheridade


É real. Entender que o nosso corpo pertence somente a nós mesmos é um dos processos mais libertadores que podemos passar. Para quem é mulher, essa questão é tão forte que parece até que a gente ganha uma "maioridade" especial quando se aceita, se sente confortável e sexy independentemente de obediência a padrões estéticos estabelecidos socialmente. Só isso já é delicioso. Mas quando se percebe a funesta relação de poder que está por trás da intensa e rigorosa fiscalização sobre nossos corpos femininos, aí é que é ainda mais poderoso não ter vergonha dos próprios atributos físicos, agradando ou não aos outros.
 

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Quando chove fora, chove dentro


Poros-goteiras à procura de abrigo. Ou de alguma borracha (se não para apagar o tempo) para amortecer a urgência das descargas elétricas lá fora e aqui dentro. 

domingo, 24 de novembro de 2013

Facção


O encontro latino americano de midiativismo Facção, que aconteceu no Rio de Janeiro desde a última sexta-feira, terminando hoje, concretizou um projeto diferente de congregação de pessoas interessadas em um mesmo tema. O debate de ontem na ECO-UFRJ sobre políticas públicas de democratização da mídia pode até não produzir diretamente resultados mais concretos, mas foi importante como espaço de interação e identificação de ideias afins para um passo seguinte, de consolidação de propostas. Bastou chegar com uma folha de papel A4 donde se lia "Mídia e revolução" e colá-la na porta da sala. Não havia roteiro ou dinâmica pré-acordada, apenas inscrevi quem queria falar, sem limite de tempo, e fui rascunhando um relatório. Experiência válida, mas a espontaneidade e horizontalidade, marcas do encontro, servem mais para catarse coletiva do que à formulação de encaminhamentos.

David Harvey no Brasil


O geógrafo britânico David Harvey está no Brasil para um ciclo de conferências sobre o direito à cidade. Embora muito negligenciado, o reconhecimento da importância desse direito é fundamental para análises mais realistas da democracia face à dinâmica capitalista. Com essa observação, vai aí adaptação de um artigo de Harvey intitulado O direito à cidade:

Saber que tipo de cidade queremos é uma questão que não pode ser dissociada de saber que tipo de vínculos sociais, relacionamentos com a natureza, estilos de vida, tecnologias e valores estéticos nós desejamos. O direito à cidade é muito mais que a liberdade individual de ter acesso aos recursos urbanos: é um direito de mudar a nós mesmos, mudando a cidade. Além disso, é um direito coletivo, e não individual, já que essa transformação depende do exercício de um poder coletivo para remodelar os processos de urbanização. A liberdade de fazer e refazer as nossas cidades, e a nós mesmos, é, a meu ver, um dos nossos direitos humanos mais preciosos e ao mesmo tempo mais negligenciados.

A urbanização sempre foi um fenômeno de classe, uma vez que o controle sobre o uso da sobreprodução sempre ficou tipicamente nas mãos de poucos [pense, por exemplo, num senhor feudal]. Sob o capitalismo, emergiu uma conexão íntima entre o desenvolvimento do sistema e a urbanização.

Como em todas as fases anteriores, a expansão mais recente do processo de urbanização trouxe consigo mudanças incríveis no estilo de vida. Mas a qualidade da vida nas cidades agora virou uma mercadoria, num mundo onde o consumismo, o turismo e as indústrias culturais e do conhecimento se tornaram aspectos importantes da economia urbana. É um mundo em que a ética neoliberal de individualismo, acompanhada pela recusa de formas coletivas de ação política, se torna o modelo para a socialização humana.
Em vista disso, precisamos de um maior controle democrático sobre a produção e a utilização do lucro. E uma vez que o processo urbano é um dos principais canais de uso desse dinheiro, criar uma gestão democrática da sua aplicação constitui o direito à cidade. Ao longo de toda a história do capitalismo, uma parte do lucro foi tributada, e em fases social-democratas a proporção à disposição do Estado aumentou significativamente. O projeto neoliberal dos últimos trinta anos caminhou para privatizar esse controle.

No atual ponto da história, essa tem de ser uma luta global, predominantemente contra o capital financeiro, pois essa é a escala em que ocorrem hoje os processos de urbanização. Sem dúvida, a tarefa política de organizar um tal confronto é difícil, se não desanimadora. Mas as oportunidades são múltiplas, pois, como mostra esta breve história, as crises eclodem repetidas vezes em torno da urbanização e a metrópole é hoje o ponto de confronto – luta de classes — a respeito da acumulação de capital pela desapropriação dos menos favorecidos e do tipo de desenvolvimento que procura colonizar espaços para os ricos.
Um passo para a unificação dessas lutas é adotar o direito à cidade, como slogan e como ideal político, precisamente porque ele levanta a questão de quem comanda a relação entre a urbanização e o sistema econômico. A democratização desse direito e a construção de um amplo movimento social para fazer valer a sua vontade são imperativas para que os despossuídos possam retomar o controle que por tanto tempo lhes foi negado e instituir novas formas de urbanização.

* Texto adaptado. Publicado originalmente na New Left Review 53, Set/Out, 2008. Tradução da Revista Piauí.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Belirsima

O tapete de asfalto nos levava a destinos de Discovery Channel com cheiro de mato seco queimado e de pedras mofadas. Às 3 da tarde de um dia como este, duas mulheres envoltas em roxo, amarelo, rosa e azul tricotavam dentro de uma vendinha em frente a uma pequena mesquita de um vilarejo no coração da Capadócia. Perdidas. Assim como perdidas éramos duas mulheres de calça jeans e cabelos soltos à mostra. Encontramo-nos assim. Speak english? Olhares e risadas de acolhimento seguidos de uma explicação incessante em turco diante do ponto indicado no mapa. Cada vez mais interlocutores (20?) até virarmos o acontecimento do dia. Teşekkür ederim, Belirsima.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Cimentos



Tudo é construção.
 
MúsicaGêneroOpçãoCulturaPãoNaturezaAviãoLuzEfeitoSombraPensamentoCrençaIdeiaSentimentoOpinião.

Cimentos

par
              ti

   cu
                   la

              res.