Em alguma manhã desta semana, a manchete não era novidade para nenhuma mulher: pesquisa do Ipea revela que 65% dos brasileiros acham que mulher que usa roupa curta merece ser estuprada."
Apesar de a pesquisa não mostrar nada além do que a gente já está careca de saber, serviu para alarmar muita gente que não percebe o grau de machismo presente em nossa sociedade nem o quanto isso é violento.
Em homenagem a essa pesquisa, compartilho o texto a seguir. Pode parecer extenso, mas representa apenas uma amostra ínfima do incessante bombardeio de machismo que as mulheres recebem diariamente.
Sou homem.
Quando nasci, meu avô parabenizou meu pai por ter tido um filho homem. E
agradeceu à minha mãe por ter dado ao meu pai um filho homem. Recebi o nome do
meu avô.
Quando eu era criança, eu podia brincar de LEGO, porque "Lego é
coisa de menino", e isso fez com que minha criatividade e capacidade de
resolver problemas fossem estimuladas.
Ganhei lava-jatos e postos de gasolina montáveis da HotWheels. Também
ganhei uma caixa de ferramentas de plástico, para montar e desmontar carrinhos
e caminhões. Isso também estimulava minha criatividade e desenvolvia meu
raciocínio, o que é bom para toda criança.
Na minha época de escola, as meninas usavam saias e meus amigos
levantavam suas saias. Dava uma confusão! E então elas foram proibidas de usar
saias. Mas eu nunca vi nenhum menino sendo realmente punido por fazer isso,
afinal de contas "Homem é assim mesmo! Puxou o pai esse danadinho" -
era o que eu ouvia.
Em casa, com meus primos, eu gostava de brincar de casinha com uma
priminha. Nós tínhamos por volta de 8 anos. Eu era o papai, ela era a mamãe e
as bonecas eram nossas filhinhas. Na brincadeira, quando eu carregava a boneca
no colo, minha mãe não deixava: "Larga a boneca, Juninho, é coisa de
menina". E o pai da minha priminha, quando via que estávamos brincando
juntos, de casinha, não deixava. Dizia que menino tem que brincar com menino e
menina com menina, porque "menino é muito estúpido e, principalmente, pra
frente". Eu não me achava estúpido e também não entendia o que ele queria
dizer com "pra frente", mas obedecia.
No natal, minha irmã ganhou uma Barbie e eu uma beyblade. Ela chorou um
pouco porque o meu brinquedo era muito mais legal que o dela, mas mamãe todo
ano repetia a gafe e comprava para ela uma boneca, um fogãozinho, uma geladeira
cor-de-rosa, uma batedeira, um ferro de passar.
Quando fiz 15 anos e comecei a namorar, meu pai me comprou algumas
camisinhas.
Na adolescência, ninguém me criticava quando eu ficava com várias
meninas.
Atualmente continua assim.
Meu pai não briga comigo quando passo a noite fora. Não fica dizendo que
tenho que ser um "rapaz de família". Ele nunca me deu um tapa na cara
desconfiado de que passei a noite em um motel.
Ninguém fica me dando sermão dizendo que eu tenho que ser reservado e me
fazer de difícil.
Ninguém me julga mal quando quero ficar com uma mulher e tomo a
iniciativa.
Ninguém fica regulando minhas roupas, dizendo que eu tenho que me
cuidar.
Ninguém fica repetindo que eu tenho que me cuidar porque "mulher só
pensa em sexo".
Ninguém acha que minhas namoradas só estavam comigo para conseguir sexo.
Ninguém pensa que, ao transar, estou me submetendo à vontade da minha
parceira.
Ninguém demoniza meus orgasmos.
Nunca fui julgado por carregar camisinha na mochila e na carteira.
Nunca tive que esconder minhas camisinhas dos meus pais.
Nunca me disseram para me casar virgem por ser homem.
Nunca ficaram repetindo para mim que "Homem tem que se
valorizar" ou "se dar ao respeito". Aparentemente, meu sexo já
faz com que eu tenha respeito.
Quando saio na rua ninguém me chama de "delícia".
Nenhuma desconhecida enche a boca e me chama de “gostoso” de forma
agressiva.
Eu posso andar na rua tomando um sorvete tranquilamente, porque sei que
não vou ouvir nada como “Larga esse sorvete e vem me chupar”. Eu posso até
andar na rua comendo uma banana.
Nunca tive que atravessar a rua, mesmo que lá estivesse batendo um sol
infernal, para desviar de um grupo de mulheres num bar, que provavelmente vão
me cantar quando eu passar, me deixando envergonhado.
Nunca tive que fazer caminhada de moletom porque meu short deixa minhas
pernas de fora e isso pode ser perigoso.
Nunca ouvi alguém me chamando de “Desavergonhado” porque saí sem camisa.
Ninguém tenta regular minhas roupas de malhar.
Ninguém tenta regular minhas roupas.
Eu nunca fui seguido por uma mulher em um carro enquanto voltava para
casa a pé.
Eu posso pegar o metrô lotado todos os dias com a certeza que nenhuma
mulher vai ficar se esfregando em mim, para filmar e lançar depois em algum
site de putaria.
Nunca precisaram criar vagões exclusivamente para homens em nenhuma
cidade que conheço.
Nunca ouvi falar que alguém do meu sexo foi estuprado por uma multidão.
Eu posso pegar ônibus sozinho de madrugada.
Quando não estou carregando nada de valor, não continuo com medo pelo
risco ser estuprado a qualquer momento, em qualquer esquina. Esse risco não
existe na cabeça das pessoas do meu sexo.
Quando saio à noite, posso usar a roupa que quiser.
Se eu sofrer algum tipo de violência, ninguém me culpa porque eu estava
bêbado ou por causa das minhas roupas.
Se, algum dia, eu fosse estuprado, ninguém iria dizer que a culpa era
minha, que eu estava em um lugar inadequado, que eu estava com a roupa
indecente. Ninguém tentaria justificar o ato do estuprador com base no meu
comportamento. Eu serei tratado como VÍTIMA e só.
Ninguém me acha vulgar quando faz frio e meu “farol” fica “aceso”.
Quando transo com uma mulher logo no primeiro encontro sou praticamente
aplaudido de pé. Ninguém me chama de “vagabundo”, “fácil”, “puto” ou “vadio”
por fazer sexo casual às vezes.
99% dos sites de pornografia são feitos para agradar a mim e aos homens
em geral.
Ninguém fica chocado quando eu digo que assisto pornôs.
Ninguém nunca vai me julgar se eu disser que adoro sexo.
Ninguém nunca vai me julgar se me ver lendo literatura erótica.
Ninguém fica chocado se eu disser que me masturbo.
Nenhuma sogra vai dizer para a filha não se casar comigo porque não sou
virgem.
Ninguém me critica por investir na minha vida profissional.
Quando ocupo o mesmo cargo que uma mulher em uma empresa, meu salário
nunca é menor que o dela.
Se sou promovido, ninguém faz fofoca dizendo que dormi com minha chefe.
As pessoas acreditam no meu mérito.
Se tenho que viajar a trabalho e deixar meus filhos apenas com a mãe por
alguns dias, ninguém me chama de irresponsável.
Ninguém acha anormal se, aos 30 anos, eu ainda não tiver filhos.
Ninguém palpita sobre minha orientação sexual por causa do tamanho do
meu cabelo.
Quando meus cabelos começarem a ficar grisalhos, vão achar sexy e
ninguém vai me chamar de desleixado.
A sociedade não encara minha virgindade como um troféu.
90% das vagas do serviço militar são destinadas às pessoas do meu sexo.
Mesmo quando se trata de cargos de alto escalão, em que o oficial só mexe com
papelada e gerência.
Se eu sair com uma determinada roupa ninguém vai dizer “Esse aí tá
pedindo”.
Se eu estiver em um baile funk e uma mulher fizer sexo oral em mim, não
sou eu quem sou ofendido. Ninguém me chama de "vagabundo" e nem diz
"depois fica postando frases de amor no Facebook".
Se vazar um vídeo em que eu esteja transando com uma mulher em público,
ninguém vai me xingar, criticar, apedrejar. Não serei o piranha, o vadio, o sem
valor, o vagabundo, o cachorro. Estarei apenas sendo homem. Cumprindo meu papel
de macho alpha perante a sociedade.
Se eu levar uma vida putona, mas depois me apaixonar por uma mulher só,
as pessoas acham lindo. Ninguém me julga pelo meu passado.
Ninguém diz que é falta de higiene se eu não me depilar.
Ninguém me julgaria por ser pai solteiro. Pelo contrário, eu seria visto
como um herói.
Nunca serei proibido de ocupar um cargo alto na Igreja Católica por ser
homem.
Nunca apanhei por ser homem.
Nunca fui obrigado a cuidar das tarefas da casa por ser homem.
Nunca me obrigaram a aprender a cozinhar por ser homem.
Ninguém diz que meu lugar é na cozinha por ser homem.
Ninguém diz que não posso falar palavrão por ser homem.
Ninguém diz que não posso beber por ser homem.
Ninguém olha feio para o meu prato se eu colocar muita comida.
Ninguém justifica meu mau humor falando dos meus hormônios.
Nunca fizeram piadas que subjugam minha inteligência por ser homem.
Quando cometo alguma gafe no trânsito ninguém diz “Tinha que ser homem
mesmo!”
Quando sou simpático com uma mulher, ela não deduz que “estou dando
mole”.
Se eu fizer uma tatuagem, ninguém vai dizer que sou um “puto”.
Ninguém acha que meu corpo serve exclusivamente para dar prazer ao sexo
oposto.
Ninguém acha que terei de ser submisso a uma futura esposa.
Nunca fui julgado por beber cerveja em uma roda onde eu era o único
homem.
Nunca me encaixo como público-alvo nas propagandas de produtos de
limpeza.
Sempre me encaixo como público-alvo nas propagandas de cerveja.
Nunca me perguntaram se minha namorada me deixa cortar o cabelo. Eu
corto quando quero e as pessoas entendem isso.
Não há um trote na USP que promove minha humilhação e objetificação.
A sociedade não separa as pessoas do meu sexo em “para casar” e “para
putaria”.
Quando eu digo “Não” ninguém acha que estou fazendo charme. Não é não.
Não preciso regrar minhas roupas para evitar que uma mulher peque ou
caia em tentação.
As pessoas do meu sexo não foram estupradas a cada 40 minutos em SP no
ano passado.
As pessoas do meu sexo não são estupradas a cada 12 segundos no Brasil.
As pessoas do meu sexo não são estupradas por uma multidão nas
manifestações do Egito.
Não sou homem. Mas, se você é, é fundamental admitir que a sociedade
INTEIRA precisa do Feminismo.
Não minimize uma dor que você não conhece.
Camila Oliveira Dias
voltoooou e não avisa safada? tava com saudades amora :) sempre linda
ResponderExcluirneshikot