quarta-feira, 26 de março de 2014

Mulher, esposa e jornalismo

Na época em que a escravidão era considerada legítima, pessoas tinham pessoas. Segundo a legislação brasileira atual, animais são considerados coisas, o que permite que pessoas tenham, por exemplo, cachorros. 

Partindo desses casos emblemáticos, é intrigante como pouco ou nada se questione sobre o arraigado costume de atribuir a ideia de propriedade a uma mulher casada. Aceita-se que uma mulher casada seja "a mulher do fulano", embora nunca se faça referência aos homens da mesma maneira. Eles são apenas os maridos – muitas vezes, até hoje, etiquetando seus sobrenomes aos das companheiras. 

Uma mulher (que, melhor do que é, está) casada simplesmente assume um papel jurídico-contratual presumidamente afetivo de cônjuge ou esposa, tão somente uma limitada dimensão do ser mulher. É inadmissível que à mera mudança de estado civil corresponda uma subjacente ideia de patrimônio.

Não obstante, o jornalismo brasileiro do século 21 segue a mesma lógica do domínio de escravos e animais em relação a mulheres casadas, o que é muito mais grave do que inadvertidos leitores de veículos jornalísticos – que não têm tanta responsabilidade nem o compromisso profissional com o bom uso do vernáculo – procederem no mesmo sentido.

É muito raro que uma notícia aluda a mulheres casadas como esposas. Só vejo "mulher do deputado", "mulher do jogador de futebol" e por aí vai. Ok, a linguagem é sexista enquanto resultante de uma sociedade machista. Mas o jornalismo tem um poder único sobre o emprego da palavra, e o respeito à igualdade de gênero deveria ser muito mais cobrado nesse campo.

Um comentário:

  1. se for pra ser mulher de alguém, além de ser minha, quero ser mulher da vida :*

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