domingo, 4 de agosto de 2013

István Mészáros


Por que não o li antes? Húngaro como Lukács e meus antepassados, István Mészáros é um autor de peso. Ganhei esse livro da imagem acima – Filosofia, Ideologia e Ciência Social – e, embora eu ainda esteja na metade, já posso dizer que é uma daquelas obras necessárias. Primeiro, Mészáros desconstrói a pretensa neutralidade de certas definições teóricas e expõe o caráter ideológico da ciência. No campo de análise (as ciências sociais e econômicas), critica Weber, Homans, Coser, Keynes e Parsons – por vezes com uma ironia fina hilariante.

Logo depois, enfrenta o grande tema da consciência de classe – a necessária e a contingente. A distância entre esses dois aspectos do "ser do proletariado" pode ser maior ou menor em situações históricas diferentes, e nenhum progresso linear na redução da diferença está implícito nas formulações de Marx sobre o problema da consciência de classe. Mas, antes de discutir alguns dos problemas relacionados, Mészaros procede à ênfase em alguns aspectos da obra de Marx, como no trecho a seguir:

"O desenvolvimento da consciência de classe é um processo dialético: é uma 'inevitabilidade histórica' precisamente na medida em que a tarefa é realizada através da mediação necessária de uma atuação humana autoconsciente. Isso requer, inevitavelmente, algum tipo de organização – seja a constituição de partidos, ou de outras formas de mediação coletiva – estruturada segundo as condições sócio-históricas específicas que predominam em uma época particular, com o objetivo estratégico global de intervenções dinâmicas no curso do desenvolvimento social. (Somente as últimas são capazes de deixar uma marca duradoura – em oposição ao sucesso efêmero da mera agitação política – na consciência do proletariado como um todo, uma vez que elas envolvem modificações objetivas no ser social da consciência do proletariado). Em outras palavras, o desenvolvimento "direto"e "espontâneo"da consciência de classe operária – seja sob o impacto de crises econômicas ou como resultado do auto-esclarecimento individual – é um sonho utópico. Não importa quanto (tendo em vista algumas experiências negativas) se possa desejar o contrário, a questão da organização política não pode ser desconsiderada. A questão real é, portanto, a criação de formas organizacionais e mediações institucionais que sejam adequadas aos objetivos estratégicos globais, considerando (a) as limitações sócio-históricas que delimitam objetivamente as possibilidades de ação em cada época, e (b) os limites necessários e os efeitos deturpadores da própria forma institucional, pois um montante indevido de "feedback negativo" de (a) e (b) – que é inevitável até certo ponto – pode não apenas anular conquistas alcançadas com dificuldade, mas também transformar a instituição originalmente dinâmica em um freio poderoso e um grande obstáculo a todo avanço posterior. O elemento paradoxal na dialética das instituições é que a sua estruturação de acordo com as limitações necessárias mencionadas em (a) constitui tanto seus traços positivos quanto suas características negativas de petrificação e autoperpetuação. A habilidade da instituição em enfrentar o desafio de uma situação histórica específica – sua raison d'être – requer firmeza estrutural e estabilidade; entretanto, seu impacto no desenvolvimento sócio-histórico produz não apenas avanços, mas também, ao mesmo tempo, um elemento de obsolescência institucional. (Esse ponto sublinha a superficialidade e o caráter evasivo de todo discurso sobre o "culto à personalidade" como uma hipótese explicativa.) A instituição é dinâmica apenas na medida em que ela se esforce na realização de sua tarefa e adquira uma camada inercial mais ou menos extensiva, no exato momento em que ela obtém domínio. Assim, a vitória de uma forma institucional específica sobre as limitações históricas que estavam em sua raiz é também, ao mesmo tempo, a derrota bem merecida dessa forma institucional. Uma derrota que é, entretanto, frequentemente transformada em uma vitória de Pirro pela instituição obsoleta, mas poderosamente ossificada à custa do corpo social que lhe deu origem. Os corretivos contra esse tipo de desenvolvimento podem e têm de ser incorporados, ou na estrutura de uma instituição particular, tomada em si mesma (na verdade uma possibilidade muito limitada), ou no arcabouço institucional como um todo, cujas partes interagem reciprocamente umas com as outras, ou ainda, tanto nas instituições particulares quanto na estrutura institucional total da sociedade. O desenvolvimento dependerá grandemente da eficácia desse grupo determinado de corretivos na minimização do feedback institucional negativo mencionado acima.
(...)
Sem um conjunto coerente de conceitos fundamentais, os fenômenos efêmeros não podem ser separados daqueles de significado duradouro (empiricismo fragmentário e positivismo). E, sem um intercâmbio dinâmico entre os vários níveis do quadro conceitual, incluindo aqueles que notificam as "mudanças capilares"aparentemente insignificantes dos fenômenos sociais, o marxismo pode degenerar em um catecismo de dogmas com significado fixo e absoluto, (por exemplo, o escolaticismo morto das fórmulas stalinistas). Contrastando com ambos, a concepção marxiana, longe de se refugiar no reino do apriorismo, fornece o quadro conceitual necessário para o estudo teórico empiricamente fundamentado, bem como para a ação política e social."

Um comentário:

  1. minha cara! grande istvan! é o maior marxista de hj
    (talvez depois do meu professor avelãs nunes, de coimbra...). parabens pela leitura! e depois se debruce na sua obra de mais de mil paginas "para alem do capital"... e boa viagem! até, bj.
    em tempo: uma das minhas fúrias é justamente esta, ou seja, contra a hipocrisia beata daquele que teimam em jurar que a sua ciência é uma ciência positiva, neutra em relação aos fins, uma ciência que não é política... isso é filhadaputice!

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