segunda-feira, 10 de junho de 2013

O viés da disponibilidade

Sobre formação de opinião pública, efeito manada e o tal sonambulismo que move o mundo, considero importantíssimo entender um pouco sobre isto: em meados dos anos 70, uma pesquisa identificou que, quando tomamos decisões, muitas vezes usamos heurísticas (numa definição simples, atalhos mentais). O problema é que as heurísticas são traiçoeiras. Úteis em muitos casos, tais atalhos, em certas circunstâncias, nos levam a erros (no jargão da área, elas produzem vieses cognitivos). Kahneman e Tversky, em estudo seminal, identificaram três heurísticas e seus respectivos vieses: a heurística da disponibilidade, a heurística da representatividade e o efeito de ancoragem. A heurística da representatividade faz com que nos desviemos da estatística em prol de associações de ideias fundadas em estereótipos. O efeito de ancoragem sugere que o ser humano tende a escolher respostas que sejam próximas a valores ou informações sugeridos pela pergunta – ainda quando tais valores não tenham absolutamente nada a ver com a resposta. Finalmente, a que queremos destacar aqui: a HEURÍSTICA DA DISPONIBILIDADE: associada à saliência de certos eventos na memória coletiva, tal heurística afirma que as pessoas concluem a respeito da probabilidade de determinado evento com base na facilidade com que ocorrências dele podem ser lembradas. É por isso que, em geral, preocupa-se mais com furacões logo após ter-se passado por um; e é por isso que riscos mais recentes ou mais espetaculares são mais combatidos do que riscos mais triviais ou mais distantes no tempo.
Estudos clássicos explicam a estrutura cognitiva que gera tais desvios usando um modelo bipolar. É como se existissem 2 sistemas de pensamento dentro de nós: um responsável pela intuição e por processos mentais automáticos; outro, responsável por processos conscientes, racionais, deliberados. Cabe ao sistema automático a maioria das tarefas cotidianas. Sua domesticação, pelo sistema consciente, leva tempo e requer esforço. As interações entre os dois sistemas é que geram os vieses. A conclusão dessas pesquisas sugere modéstia quando às nossas capacidades como agentes racionais.

Aí é que entra o conceito de nudge, prática que levaria o poder público a arquitetar escolhas quando as pessoas estão diante de situações nas quais há alta probabilidade de que façam escolhas ruins. Diante desse pano de fundo de escolhas equivocadas, agentes enviesados e inevitabilidade, os autores Thaler e Sustein propõem o uso do nudge como paternalismo libertário. Há nela algo de paternalista, pois a arquitetura de escolhas visa, sim, induzir comportamentos. Mas também seria libertária, pois a possibilidade de escolhas estaria sempre presente. Não seria um paternalismo puro. O nudge como instrumento de política pública ainda é relativa novidade no Brasil.
 
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Baseado no artigo "Heurísticas: Yes, a opinião pública também é irracional!", de José Vicente Santos de Mendonça na Revista Insight Inteligência, nº 60.

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