quarta-feira, 19 de junho de 2013

PEC 37: realmente sabemos do que se trata?

Por ocasião das manifestações que correm pelo Brasil, é muito infeliz que a presença do senso comum predomine porque enfraquece o sentido original das reivindicações. Nesse contexto, a mídia aproveita para empurrar à sociedade a campanha contra a aprovação da PEC 37 e seu numeroso rebanho simplesmente adere a isso sem fazer uma reflexão adequada a respeito. Então, lá vou eu desencarregar minha consciência, tentando contribuir para um contraponto que entendo necessário.
 
Primeiro, você já leu o texto da PEC 37? Ah tá, então prossigamos. A investigação criminal tem por finalidade a completa elucidação dos fatos, com a colheita de todos os elementos e indícios necessários à tutela jurisdicional adequada. O inquérito policial é o único instrumento que garante o controle de todas as partes envolvidas no processo e também do juiz, sendo um meio de investigação formal, com regras e prazo, compatível com o devido processo legal e com o Estado democrático de direito.
 
Já a investigação criminal realizada pelo Ministério Público é marcada pela falta de regras legais claras que a regule, o que leva a uma distorção para a democracia brasileira. Confira-se o meu testemunho pessoal: nunca gostei de direito penal porque acho extremamente burro enjaular um amontoado de pessoas pobres e negras sem que haja um investimento consistente na superação da causa do problema, que é social. Ainda assim, quando eu tinha uns 20, 21 anos de idade, me surgiu a oportunidade de fazer um estágio na área criminal do Ministério Público do Rio de Janeiro e resolvi aproveitá-la. Se a matéria jurídica em si não me despertava grande interesse, a experiência sócio-antropológica era valiosa. De um lado, promotores de justiça elitistas, bem à moda brasileira, seguindo a ideologia dominante de encarceramento máximo. De outro, a maldita plebe. As audiências pareciam reunião de comadre entre juízes e promotores e os réus eram muitas vezes humilhados. Mas o mais marcante que ficou para mim foi a frase do meu chefe, promotor de justiça, que me dizia: "Nós fazemos o gol, não é o juiz. O juiz sempre vai na cabeça do Ministério Público, é muito raro que discorde. Em 99,9% dos casos, o juiz segue o que o promotor defende".
 
De certo modo, é até natural que isso aconteça, pois, de maneira contrária ao que quer a nossa Constituição Federal, o MP vem realizando investigação criminal, o que envolve, com sua  autoridade, privilégios no acesso a dados e fontes que a parte ré não consegue acompanhar. Então, ora, se o MP tem esses poderes, deduz-se que pode ter ido mais a fundo na questão, permitindo que sua opinião seja a mais acertada. Assim, de maneira hipertendenciosa, o MP denuncia, investiga e ainda praticamente julga os próprios processos em que é parte! Se já é assim em relação a pequenos delitos, podemos imaginar a distorção que acontece quando o processo é impregnado de viés político. Não é à toa que a grande mídia encabeçada pela Rede Globo é contra a PEC 37. Portanto, recomenda-se desconfiança e mais reflexão. Sabe o golpe militar de 1964? Até hoje sustentam por aí que foi uma revolução porque muita gente o apoiou. Se dermos ferramentas para que se arme e se fortaleça uma ditadura do Judiciário, não adianta depois chorar pelas consequências, a democracia sai perdendo, vão nos culpar e ninguém vai se orgulhar disso. Pense bem.
 
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro.
Em seguida, levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois, prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas, como tenho meu emprego,
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.
 
Bertold Brecht

Um comentário:

  1. Pesquisando, li que Inglaterra, País de Gales, Irlanda, Irlanda do Norte, Canadá, Chipre, Dinamarca e Finlândia são todos chamados países de primeiro mundo e, em nenhum desses países, o Ministério Público realiza a investigação. A manipulação da Globo nessa questão foi tão explanada que, no programa da Monica Waldvogel, na Globo News, ela mesma se posicionava contra a PEC, argumentando que a aprovação da PEC só deixaria o Brasil igual a um país da África! Absurdo!

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