sexta-feira, 14 de junho de 2013

Protesto na rua em tempos de redes sociais: pegamos carona ou dirigimos?

Ontem fui ao protesto no centro do Rio de Janeiro contra o aumento das passagens do transporte público. Posso dizer: mais do que manifestação política propriamente dita, foi uma grande manifestação de insatisfação de consumidores de serviços públicos. Exatamente o contrário do que afirmou, com sua miopia característica, o governador Sérgio Cabral (ele disse: “essas manifestações estão tendo um caráter, um ar político que não é espontâneo da população"). De fato, havia militantes de partidos políticos e a questão de fundo é política, mas considero que o protesto, inserido na onda de manifestações que acontecem por todo o Brasil, é um fenômeno bastante semelhante a outros que têm ocorrido pelo mundo, sendo a Primavera Árabe o mais representativo deles.
 
A base desse fenômeno deriva de outro fenômeno, a chamada “comunicação viral”, que age como uma epidemia em um formato de comunicação que aproveita a capacidade tecnológica de multiplicar a informação rapidamente, atingindo milhares e até milhões de indivíduos. A ação viral depende do volume de transmissão entre as pessoas e se mostra capaz de alterar opiniões da noite para o dia, geralmente atingindo grupos distantes geograficamente. Isso significa que a participação popular em massa, em tempos de internet, pode ter origem em impulsos ou modismos, como manifestações pautadas na superficialidade de informação, sem refletir um entendimento ponderado a respeito do assunto em questão, haja vista que através de um simples "clique", uma mensagem rápida e de fácil acesso circula por uma rede incomensurável de pessoas. Um notório exemplo da ocorrência do fenômeno no Brasil é a mensagem transmitida reiteradamente, via e-mail e outras ferramentas virtuais, pela qual se divulga a falácia de que uma determinada quantidade de votos nulos em uma eleição seria capaz de conduzir à anulação da mesma. A enorme repercussão da mensagem na internet indica que seu conteúdo foi admitido como verdadeiro por uma também enorme quantidade de eleitores brasileiros, levando a Justiça Eleitoral a promover informes publicitários para esclarecer a população.

No protesto de ontem, vi muito desse fenômeno viral: muita gente sem um pingo de discernimento político aderiu ao chamado replicado nas redes sociais e simplesmente “pegou carona” nas manifestações contra o aumento das passagens, que realmente é insuportável, para expressar insatisfação diante de um pacote genérico de distorções que dizem respeito à frequente inversão de valores no funcionamento das cidades, que está tão escrachada quanto insustentável.

O incipiente grau de politização dos manifestantes não retira a importância do acontecimento, pois, ainda que sem orientação político-partidária, o protesto pode produzir relevantes efeitos políticos concretos, como um carro desgovernado que pode atropelar uma liderança política que não está agradando. Mais ou menos como foi deposto Mubarak, então presidente do Egito. Mas, e depois? Como reorientar a política sem uma direção político-partidária por trás do movimento? Aqui no Brasil, acho que ainda dá tempo de os partidos de esquerda se organizarem e se apresentarem adequadamente para absorver a demanda por representatividade que se coloca tão explicitamente.

3 comentários:

  1. La, parabéns pela iniciativa de publicar suas experiências e reflexões no blog. E com esse texto delicioso de se ler fica melhor ainda!! - Felipe Iraldo Oliveira Biasoli

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  2. Oi Larissa. O texto está realmente uma delícia de ler! Parabéns!

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